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sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

RESENHA: A HORA DA ESTRELA

A hora da estrela, Clarice Lispector. Rio de janeiro: Rocco, 1998. 87p.

Por Valéria Maria de oliveira da SILVA-UECE/SEDUC

A obra A hora da estrela de Clarice Lispector, escritora de certa tendência intimista e adepta ao existencialismo, têm como eixo principal o questionamento do ser, o estar-no-mundo e a pesquisa do ser humano indo sempre em busca da compreensão da individualidade. A escritora analisa as características que constituem os indivíduos e não se preocupa com a construção de um enredo estruturado com começo, meio e fim.
O romance é narrado por Rodrigo S. M. que se identifica como autor da história de Macabéa, moça nordestina de 19 anos que migrou do sertão de Alagoas para o Rio de Janeiro. O narrador diz ter a necessidade de contar sobre a nordestina e se projeta nela para refletir sua própria vida. Portanto, ele sofre um deslocamento para dentro da narrativa, transformando-se em personagem e em virtude disso, ele é narrador de Macabéa e protagonista de outra história que se cruza com a dela. A esses relatos interligam-se os questionamentos de Rodrigo sobre sua maneira de narrar e os motivos que o levam a escrever.
Macabéa é substituível como milhares de nordestinos que são engolidos pelas cidades grandes. Inicialmente, sua única conexão com o mundo é uma tia que lhe criou depois da morte dos pais, depois é Olímpico, um namorado nordestino que conhece nas ruas do Rio. Os dois têm em comum às origens, a infância sofrida e a vida difícil que enfrentam na terra estranha, porém, ela é introvertida e sem perspectivas, enquanto ele é extrovertido, ambicioso e maltrata a namorada. Olímpica troca Macabéa por Glória, colega de trabalho da protagonista, pois esta é um meio dele conseguir ascensão social, visto que era carioca e filha de açougueiro. A partir daí, Glória será a conexão de Macabéa com o mundo. A morte a faz atingir seu objetivo: é a hora da estrela.
Macabéa é um substantivo coletivo, a resistente raça teimosa, o Nordeste rural com suas dificuldades contracena com a engrenagem urbana, a cidade inconquistável. Ela é o grito daqueles que estão marginalizados social e existencialmente, denunciando uma classe social pobre e sem consciência política. Clarice Lispector usa a literatura para denunciar o problema da miséria no Brasil, trazendo reflexões sobre a migração do nordestino e a sua adaptação ao eixo urbano do sul do país. Ela apresenta a estrutura interna do ser humano massacrado, questionando o mundo organizado e a cultura dominante.
Através da originalidade do estilo e da profundidade psicológica no enfoque de temas aparentemente banais, descortina-se a pobreza feia e promíscua e ao mesmo tempo a singeleza de vidas tão pouco interessantes, indo além da descrição realista de um cotidiano inexpressivo. A narrativa transita entre o lado trágico e o lado esplêndido da vida, entre a fragilidade e a grandeza do ser humano.
Escrito com muita criatividade e simplicidade A Hora da Estrela é um romance excepcional, com poucos diálogos e muitas percepções do narrador que nos deixa totalmente envolvidos e apaixonados pela narrativa. Pode ser considerado como um dos mais belos romances de Clarice Lispector por ser a junção do conjunto de sua obra, sendo, pois sem dúvidas a sua própria hora de estrela.

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